Um coquetel com cachaça de jambu, bourbon e maracujá, servido no restaurante dos irmãos Thiago e Felipe Castanho, é a porta de entrada para os sabores do Pará. Faz tremer que nem um bom carimbó da Dona Onete
Por Sergio Crusco

Ir a Roma e não ver o Papa, OK. Vai que ele está em missão na África do Sul ou bola para Papa você nem dá. Ir ao Pará e não comer jambu é que eu quero ver. A erva que adormece a boca está em tudo. No pato, na cachaça, no arroz, no tacacá, em lugares onde você talvez nem imagine. Faz sucesso por lá um pequeno frasco com o extrato da planta, basta uma gotinha espalhada nos lábios para que se tenha uma experiência de tremelicância que dura segundos verdadeiramente intensos. E não funciona só na boca, diz quem manja do trilili. Dona Onete, divina dama do carimbó, já cantou o tremor do jambu numa letra safada e didática.
O ativo da planta, chamado espilantol, é usado também na cosmética. Diz-se que relaxa a pele e alivia marcas de expressão. Como nosso assunto é dringue, preferimos desvendar esse mistério tomando um coquetel no Vaticano da culinária paraense, o restaurante Remanso do Bosque, dos irmãos Thiago e Felipe Castanho, em Belém. O Tacacachaça (R$ 22) é o drinque de maior sucesso da casa, com cachaça de jambu, bourbon, maracujá, bitter e clara de ovo. Vem numa cuia parecida com a do tacacá e, claro, também faz tremer, mas só um bocadinho. Um dos coquetéis mais equilibrados que já provei. Está tudo ali: o aroma e a dormência do jambu, a pegada de sabor redonda do bourbon, a acidez da fruta, a cremosidade provocada pela clara, um toque de amargor do bitter de laranja com embiriba, doçura na medida exata. É o Pará pela porta da frente, eu diria.

Sem contar que o jantar no Remanso, em boa e numerosa companhia, foi uma daquelas festas pantagruélicas em que cada um pede um bocado e a farofa, embora chique, rola solta, cada um compartilhando com prazer sua porção. “Ai, prova isso, tá divino!” Linguiça artesanal de porco e jambu num molho de mel de uruçu e tucupi, camarões empanados na tapioca (perdão, amigos nipônicos, é melhor que tempura), beiju com pesto de ervas e búfala do Marajó. Filhote, tambaqui, tucunaré e um arroz de pato com tucupi, jambu e castanhas do Pará que não é de rezar, é de chorar de alegria. Tudo isso pede outro drinque, fui de Jambu Sour (R$ 19), versão tropical do Pisco Sour com a tal da cachaça, limão, clara de ovo e Angostura. Embora o coquetel, ácido e refrescante, servisse para assentar os exageros de quem achava que aquela fosse a última refeição na face da terra, não foi possível chegar à sobremesa. Mas dei uma colherada na panna cotta de baunilha amazônica com calda de cupuaçu e paçoquinha de rapadura. Uma textura de sonho que qualquer Papa, por mais bobo que seja, não vai deixar de abençoar.
Vai lá: Remanso do Bosque, Rua 25 de Setembro, 2350, Bairro Marco, tel. (91) 3347-2829, Belém, Pará
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Dona Onete canta o tremor do jambu, para quem não sabe o que é bom. E outros carimbós sacudidos para continuar no tremelique
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Crédito das fotos: Sergio Crusco
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